Especial: Mulheres de fibra mostram veia empreendedora em queijarias do Brasil

Conheça um pouco sobre quatro produtoras de queijo que falam sobre sua rotina à frente desse ofício

Pesquisa do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) mostra que o número de empresárias aumentou 34% nos últimos 14 anos. De acordo com este levantamento, somente no ano de 2014, tínhamos 7,9 milhões de empresárias.

E se o empreendedorismo feminino cresce cada vez mais, no campo, a realidade não é diferente. É o que o Portal do Queijo quer mostrar, destacando quem são as guerreiras que atuam diariamente na produção do queijo e estão fazendo a diferença pelo Brasil rural. São elas: Solange, Charlana, Dona Conceição e Irenice.

Solange Aparecida Vieira Soares é produtora do Queijo Canastra da Fazenda Capão Grande

 

“Eu acredito que o mundo mudou, a mulher ficou independente: vai lá e faz até o fim”, diz Solange Aparecida Vieira Soares, produtora do “queijo minas artesanal – Fazenda Capão Grande”, na região da Serra da Canastra, em Minas Gerais. Ela conta que se interessou pela produção de queijo artesanal desde que se casou com Carlos Henrique, há 24 anos. “Porém, por causa da desvalorização do queijo e doença do meu sogro, deixamos de produzir por 16 anos”, lembra.

História parecida com a da produtora de queijo artesanal colonial da marca Queijos Baldo, residente no Rio do Sul, em Santa Catarina, Charlana Deiseana Avi Baldo, que se interessou pela atividade após se mudar para a casa do sogro, que era produtor. “Nossa marca foi criada pelo meu sogro e minha sogra há trinta anos. Eu e meu marido Samuel demos continuidade aos negócios, ampliamos, crescemos, mas nunca tivemos funcionários e sempre trabalhamos com leite produzido aqui mesmo, na nossa propriedade”, orgulha-se Charlana.

Dona Conceição, produtora de queijo frescal branco e temperado, em São Paulo, desde sempre, teve interesse pela produção queijeira. “Desde que me conheço por gente, sempre vi minha mãe fazer queijo. E, enquanto morei, no campo fazia algum queijo em casa também, mas não para vender. Depois, fomos para a cidade, e, há vinte anos, eu e meu marido conseguimos comprar um sítio e voltamos a produzir. Foi quando ele comprou também algumas vacas e eu inventei meu próprio jeito de fazer o queijo e a clientela adorou!”

Irenice Bicalho, produtora do queijo minas artesanal na cidade de Conceição do Mato Dentro, Minas Gerais, explica que faz parte da terceira geração produtora de queijos de sua família. “Eu e meu marido cuidamos da produção direta dos queijos. Somos a terceira geração produtora. Tanto a parte da produção quanto o cuidado com gado, de vacinação, testes, nós quem tomamos frente e cuidamos. É um trabalho em família”.

Irenice Bicalho produtora do Queijo Tomazinho

Sexismo? Na queijaria, não.

 

Para Solange, a diferença entre produtores e produtoras é que “a mulher é mais detalhista, atenciosa e amorosa em tudo que faz”. “A mulher sabe conversar melhor com quem trabalha junto com ela e também sabe contar a sua história para vender”, explica Dona Conceição. “Nós, mulheres, trabalhamos com a  alma, somos sensíveis e isso faz toda diferença”,
defende Charlana.

Charlana contou ao Portal do Queijo que é muito opinativa e sempre tem suas observações ouvidas por seu marido Samuel Baldo. “Ao longo desses dez anos, nunca encontrei nenhum desafio ou preconceito em trabalhar com queijos artesanais”, afirma. Solange também foi taxativa ao ser perguntada sobre sexismo: “Não vejo. Pelo contrário, sou muito bem tratada e as pessoas acham interessante uma professora efetiva no município e no estado, virar produtora de queijo”.

Charlana Deiseana Avi Baldo e o marido, produtores dos Queijos Baldo

Por outro lado, Dona Conceição lembra que, apesar de receber apenas dicas e ajuda dos companheiros de produção, na hora de vender, alguns clientes homens confundem as coisas: “quando vê uma mulher vendendo, às vezes, acha que ela está disponível também. Mas a mulher sempre sabe contornar a situação”, aponta.

No ponto de vista de Irenice, a presença da mulher geralmente é taxada como algo “fácil”. “Não é fácil ser mulher e produtora. Eu sofro algumas dificuldades. Por exemplo, sou dona de casa, tenho que sair para o mercado, tenho que vender, produzir, tenho filhos. É uma vida corrida. É uma cobrança muito grande, mas, vale a pena se queremos qualidade e um produto de valor. Tenho que ir atrás”.

 

Produção familiar

Assim como na família de Charlana e seu marido, nos laticínios de nossas entrevistadas, a produção é bem familiar. Solange produz em parceria com seu marido Carlos Henrique e seu filho Gustavo, que se formou em técnico agropecuário e voltou para a Fazenda. E a Dona Conceição, que trabalhou quase 20 anos sozinha com seu marido, ganhou, há um ano, mais companhias para tocar a produção. “Minha filha decidiu recuperar o negócio de queijos e, agora, temos mais uma amiga da família, que ajuda na ordenha, e ainda minha neta auxiliando na produção dos queijos”, comemora.

 

Vida corrida

Conciliar queijo, casa e vida é o principal desafio de produtora de queijo do sexo feminino na visão de Dona Conceição. “Quando sai de casa, a queijeira tem que voltar rápido ou deixar alguém cuidando do queijo. De domingo a domingo, sem feriado. Então, o mais difícil é dar conta de cuidar dele e ainda de todo o resto que uma mulher faz: da casa, dos filhos, da comida, dos bichos, do jardim e de viver mesmo, porque a mulher tem que acordar muito cedo e vai até a noite vivendo para o queijo”, detalha.

 

Certificação em pauta

Queijo frescal temperado feito por Dona Conceição, em São Paulo

“Dizem que o meu queijo é especial, que tem sabor, leveza e maciez. O motivo é o cuidado com o leite e o fato de a gente fazer com responsabilidade o queijo com o leite fresco, vivo, cru. E é por isso que ainda não podemos ter uma marca”, conta Dona Conceição, que não sabia da obrigatoriedade da pasteurização. E ela vai direto ao ponto ao falar da regra: “Olha, eu já ajustei muita coisa no meu jeito de fazer queijo,  mas não vou mudar a minha receita e fazer virar um queijo de indústria”.

 

O queijo frescal feito pelas mãos de Dona Conceição é premiado, mas a pedido dela não pode ser divulgado. “A gente sonha em ter apoio e uma licença pra existir, e sei que não é só aqui. Não estamos sozinhas. Têm muitas mulheres que fazem seu queijo fresco em família e não podem melhorar nada, porque fingem que a gente não existe”, afirma.

Queijo Canastra sendo maturado na Fazenda Capão Grande

O apoio sonhado por Dona Conceição está sendo trabalhado em várias regiões do país, como por exemplo, em Minas Gerais, estado no qual algumas das regiões produtoras já são liberadas para a produção do queijo Minas Artesanal, seguindo algumas normas estabelecidas pelo Instituto Mineiro de Agropecuária – IMA.

 

Os produtos de Irene são certificados desde 2010 e, após receber a certificação do IMA, a situação melhorou para sua produção. “Antes, eu vendia o queijo maturado para fabricação de pão de queijo. Hoje, o queijo curado virou um produto fino, que as pessoas utilizam para a degustação e harmonização. As coisas ficaram mais fáceis depois que fomos certificados. As pessoas procuram mais pelo produto. Não é tão fácil receber o certificado, mas, ficamos sempre na expectativa para que os outros produtores possam conseguir e valorizar cada dia mais o queijo artesanal”, explica.

                             Queijos Baldo

 

A força e garra das mulheres que se dedicam a produção de queijos, ao ambiente familiar e buscam a realização de conquistas e sonhos devem ser reconhecidas e parabenizadas. A equipe do Portal do Queijo fica honrada em poder compartilhar e conhecer um pouco dessas histórias. E você, o que achou? Envie para nossa equipe sugestões de histórias que merecem ser compartilhadas aqui!

 

*Colaboração: Luana Rodrigues

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